OS TEMPOS QUE CORREM. Miguel Vale de Almeida


30.5.04  

Quando for (mais...) velho quero ser como ele.



Hoje fui ajudar uma colega a entrevistar o antropólogo Sidney Mintz para a revista que dirijo, a Etnográfica. Mintz revelou-se um daqueles americanos que me fascinam. Os pais emigraram para os EUA, vindos de um país do Leste da Europa. De origem humilde, revolucionários, instalaram-se numa cidade de New Jersey. A mãe era sindicalista e o pai cozinhava no seu próprio pequeno restaurante. Mintz acabou por fazer o curso com a GI Bill (programa que permitia aos soldados frequentarem a universidade a custos baixos). Foi comunista, apanhou com o McCarthyismo em cima, fez pesquisa em Porto Rico, Jamaica e Haiti, e sempre defendeu uma junção entre o materialismo histórico marxista e a noção antropológica de cultura. Trabalhou com modelos e temáticas que hoje muita gente pensa estar a inventar a partir do zero: História, economia política, colonialismos, histórias de vida, cultura material, crioulização... Mas o que eu gostei mesmo nele hoje foi da energia, do prazer ao falar dos estudantes, da gratificação do acto pedagógico, da preocupação com as pessoas, com as circunstâncias das suas vidas, da necessidade de uma visão do mundo baseada em ideiais de justiça e equidade. Em suma, passei a tarde com um verdadeiro mensch, a palavra iídiche para definir... Pessoa.

mva | 20:43|
 

Estereótipos.

Muita gente acha que os estereótipos são uma espécie de falha moral ou ética e que a tarefa de movimentos e pensadores é destruí-los. Acho que não é bem assim. Haverá sempre estereótipos, pois eles resultam das categorias sociais, algo que é parte intrínseca da organização do social. A questão é, antes, questionar as categorias e impedir os efeitos dos estereótipos. Claro que eu preferiria que as pessoas não tivessem estereótipos ou que piamente acreditassem que eles são errados. Mas não sou muito simpatizante de utopias salvíficas ou da conversão das mentes: o que eu quero é que os estereótipos não tenham consequências negativas, opressivas ou excludentes na minha vida.

Aparentemente a APAV organizou no Rock in Rio um evento em que as pessoas "estereotipadas" respondiam a perguntas dos transeuntes, para ajudar a destruir os estereótipos. Só que, junto com negros e gays, estavam culturistas, seguranças de discotecas e políticos. Ora, isto é confundir perigosamente o mero estereótipo com o estereótipo que resulta de categorias hierárquicas e excludentes. Pouco importa que haja ideias feitas sobre seguranças de discotecas (e, até, atrever-me-ia a dizer, sobre negros e gays). O que importa é que negros e gays não sejam diminuidos na sua cidadania - coisa que só muito remotamente acontecerá a seguranças de discotecas e a políticos. Não confudam estereótipos - um resultado dos modos cognitivos e sociais de ser/viver individual e socialmente - com relações de poder.

A luta da desconstrução social e dos direitos não é um trabalho de "conversão religiosa das mentes", de criação de espíritos puros, de estabelecimento de um regime de "Verdade". É um trabalho de exigência de direitos.

mva | 20:32|
 

Novidades.

Acedendo a pedidos de várias famílias pus o "target blank" nos links, que permite abrir nova janela quando se liga. Acho que é um serviço simpático para os preguiçosos do botão direito do rato... Corrigi o link da Jó Bernardo e acrescentei um excelente serviço de informação: "365gay.com".

mva | 20:25|
 

VISTO.



Desassossego, de Catarina Mourão. É sempre difícil escrever sobre trabalhos de pessoas amigas. Para mais, fui comentar este documentário ao King. Mas Desassossego é um filme de uma melancolia extraordinária, em três episódios sobre três tipos de pessoas diferentes em torno do tema comum da "casa": o vendedor de imobiliária, as burguesas liberais, e o senhor popular que tem uma pequena empresa de transportes de mudanças. Portugal entra-nos pelos olhos adentro - e é isso que uma documentarista deve fazer. Parabéns, Catarina!

mva | 20:21|
 

VISTOS.

The day after tomorrow e Lost and Delirious. O primeiro enche o olho com os efeitos especiais e a visualização de uma fantasia negativa. De resto, é um desastre de non sequiturs narrativos. No caso da exibição portuguesa, é traduzido por uma senhora que não tem vergonha de pôr o nome dela no ecrã: Ana Maria Nobre, que há-de ficar eternamente conhecida como a pessoa que, além de mil outras asneiras, traduz chauvinist pig ("machista") por "porco Calvinista". O segundo tem a virtude de ser um filme sobre amor lésbico juvenil e o efeito dramático que a homofobia pode ter. Mas, infelizmente, é um filme errático, com soluções um pouco esperadas. Quand-même, a ver por muit@s para melhor educação do reino...

mva | 20:14|
 

Heteros anti-homofóbicos.

Não há link disponível mas, na Pública de ontem, Pac, que era dos DaWeasel, responde a um daqueles inquéritos de suplemento soft de jornal. Quando lhe perguntam sobre os defeitos responde que devem colocar a pergunta à sua mulher, que tem que o aturar. Serve esta para ficarmos a saber que é casado com uma pessoa do sexo oposto. Um pouco abaixo perguntam-lhe quais são os seus valores. E ele diz algo como isto: são basicamente os judaico-cristãos; excepto as barbaridades da misoginia e da homofobia, que não suporto. Excelente resposta. Por um lado o reconhecimento de que, de facto, valores éticos e morais do judaico-cristianismo são aceitáveis e "o que temos" (recusando um discurso em que o bébé vai fora com a água do banho); por outro, a demonstração de que alguns podem e devem mudar. Quem me dera que houvesse mais heteros a fazerem declarações destas... Viva o Pac!

mva | 20:07|


28.5.04  

A esquerda de cácárácá.

Tive acesso a um inquérito feito no Parlamento Europeu. Nele, o deputado socialista António Costa - um dos candidatos nas eleições cuja campanha começa agora - discorda da possibilidade de casamentos lgbt e da adopção por lgbts.

Há um certo liberalismo de esquerda face à política da identidade que me irrita. Chamo a isto a esquerda de cácárácá: retórica simpática mas impotência completa no pensamento radical e na acção consequente. É comum encontrá-lo, por exemplo, no PS e no PC (e não só...) e em muitos movimentos sociais e opinião pública em Portugal. Quais as suas características? Em primeiro lugar, na questão de género, uma defesa da igualdade de direitos, mas uma aceitação do género como princípio de "diferença": let women be women and men be men. Isto resume-se nas tontices sobre a beleza de "ser feminina apesar de feminista"; ou na reprodução da ordem do género quando se propõe, com supostas boas intenções, apoios do estado para que as mulheres possam ficar em casa ou no sentido de diminuir o seu tempo de trabalho (não lhes ocorrendo que possam ou devam os homens fazer o mesmo). Normalmente isto prolonga-se na aceitação acrítica de conceitos de feminilidade e masculinidade essencializados, que redundam na "necessidade das crianças terem um pai e uma mãe" quando chega à questão da adopção por homossexuais... Em segundo lugar, as manifestações de boas intenções sobre os direitos lgbt e a luta contra a homofobia param - e entram numa contradição insanável que eles se recusam a ver - quando surgem os famosos "interesses das crianças" como ressalva para a adopção (assim como o argumento do "egoísmo gay e lésbico" quanto à reprodução - como se o desejo hetero de ter filhos não pudesse, segundo essa "lógica", ser também acusado de egoísta...); ou a resistência à ideia de casamento entre pessoas do mesmo sexo. Há nisto uma implícita noção de que há uma falha nos homossexuais e lésbicas, uma ideia que se aproxima perigosamente das noções católicas sobre os homossexuais como pessoas com um problema e que, não devendo ser discriminadas explicitamente, devem refrear-se e aceitar a menoridade de direitos. Mas há um terceiro ponto interessante: esta esquerda vê-se como anti-racista e não aceitaria por um minuto que houvesse leis baseadas na ideia de menoridade ou inferioridade racial. No entanto, esta esquerda (e as origens multiculturais de António Costa deviam levá-lo a reflectir sobre isto) esquece-se que o racismo não é apenas o preconceito de cor, é algo que já foi regulado legalmente: com a proibição de casamentos entre pessoas de "raças" diferentes, com a proibição da miscigenação por ser vista como algo de degenerativo, com proibições de exercício de profissões, voto e direitos por causa de supostas falhas constitucionais (biológicas, etc) das raças inferiores. Não percebe esta esquerda que é exactamente isso que hoje faz em relação quer às suas noções essencialistas de género quer em relação à limitação dos direitos lgbt?

mva | 19:16|
 

Shalom/Salam.

Simpatizo com a Esther Mucznik, não só pela honestidade do seu pensamento (com que nem sempre concordo) como pelo facto político de ser a primeira pessoa judia portuguesa a assumir-se como tal enquanto comentadora na imprensa, num país que insiste em limpar o judaísmo da sua memória colectiva. Mas a sua crónica de hoje é um bocado atrapalhada. Desde logo por meter no mesmo saco os movimentos lgbt e as manifs anti-globalização, e estabelecendo uma visão maniqueísta entre quem está contra e a favor de... bem, e aqui é que o problema começa: EM, como muita gente, coloca a linha divisória no anti-semitismo e anti-judaísmo. Também eu acredito nessa linha, porque é fundacional da divisão entre pensamento autoritário e pensamento democrático na Europa. Não se pode é vê-la onde ela não está. Se há coisa que me irrita é o anti-semistismo implícito, profundo, inconsciente quase, que permeia muito do pró-palestinianismo e anti-israelismo, sobretudo na esquerda. Mas também me irrita o reverso, aquilo que EM faz na crónica de hoje. Questionar a política do estado de Israel não é questionar o estado de Israel. Apoiar a causa palestiniana não é apoiar o Hamas e os bombistas suicidas. Já agora, fica a minha opinião sobre o assunto:

Acho que Israel é um estado de pleno direito e qualquer proposta da sua extinção é criminosa. Não me importa nada, hoje, como ele foi constituído: também os EUA ou o Brasil foram feitos com o extermínio dos índios e a importação de escravos e Portugal com a expulsão dos árabes e o comércio de escravos. E a Palestina é em larga medida uma invenção (como quase todas as nações...) pós-Israel, resultante da marginalização dos habitantes árabes locais. Mas a História é assim e remendá-la a posteriori é tão idiota como reivindicar legitimidades históricas sobre territórios. A questão é, pois, uma de democracia, cidadania e direito à igualdade - só possíveis com a paz, mesmo que a paz seja a da derrota relativa de ambos os lados. O que precisa ser "remendado" em Israel-Palestina é a situação dos palestinianos, vítimas dos fundamentalistas e terroristas palestinianos e do terrorismo de estado de certos governos e tendências israelitas. Em última instância também os israelitas são vítimas disso, assim como são vítimas dos ataques terroristas de alguns palestinianos. Não consigo simpatizar (understatement of the year...) nem com o Hamas nem com Sharon. Crispadas - e tão dramaticamente - como estão as coisas, a única solução passa por aceitar os mecanismos toscos que ainda temos, a saber, a constituição de estados. Um palestiniano e um israelita. O que implica a divisão de terra e recursos, com supervisão internacional, de preferência com o apoio de um governo não Republicano americano. Passa, infelizmente, pelo adiamento do sonho de um estado laico partilhado por palestinianos muçulmanos e cristãos, por israelitas árabes e judeus e por todos os que nem religião têm e oriundos das mais diversas partes do mundo. Mas como a actual situação é uma situação de desproporção de forças, nada acontecerá enquanto o governo do estado de Israel não ceder. Curioso é que muitos judeus e/ou israelitas dizem o mesmo.

Acredito que muito anti-israelismo esconda anti-semitismo. Mas o anti-semitismo é um problema muito mais vasto e profundo, a ser combatido implacavelmente. Nem todo o anti-israelismo é anti-semita. E, sobretudo, "anti-sharonismo" não é necessariamente anti-israelismo. Começar a confundir anti-israelismo com anti-semitismo pode acabar por ser contraproducente para a causa que defendo (e que EM obviamente também defende): a do combate sem tréguas ao anti-semitismo e todas as formas de racismo, xenofobia e etnocentrismo.

É pena que a política dos últimos governos de Israel - mas sem dúvida também o regresso do anti-semitismo no mundo - tenha tido como dano colateral o fim de uma diáspora judaica cosmopolita, progressista e crítica do sionismo fundamentalista.

mva | 18:56|


27.5.04  

Querelle de Bahia.



De repente, escrever sobre o Brasil deu-me nostalgia. Fico logo "em trânsito", uma espécie de suave transe, em que viajo até lá na cabeça. Este movimento fez-me recordar a única figura religiosa por que nutro algum carinho: o Marinheiro, ou Mano Marinheiro, ou Martim Pescador, figura do Candomblé que encarna as qualidades de Mercúrio e Hermes (e que eu vejo como santo padroeiro da interpretação antropológica...). Um bebedolas malcriadão que liga este mundo ao(s) outro(s), bamboleante como se querem os marujos, de-cá-pra-lá Atlântico fora. Aqui fica o meu, comprado num mercado bem popular da parte baixa de Salvador (e visto ao vivo, incorporando uma das minhas mães de santo favoritas lá em Ilhéus - mas para isso têm que ler o meu livro "Um Mar da Cor da Terra"...).

mva | 21:36|
 

They couldn't care less...

Telejornal da SIC. O grupo musical "Canta Bahia" (que os teleportugas insistem em escrever sem h...), residente em Portugal, faz um hino à selecção portuguesa de futebol e ao treinador, que é brasileiro. O âncora - Don Rodrigo - comenta como os brasileiros vão estar a apoiar Portugal no Euro.

Ora, modéstia à parte, até conheço bem o Brasil. Se é verdade que os Portugueses usam o Brasil como fantasia compensatória (apoiando-o, emulando-o, projectando-se nele), num típico complexo de pequeno país colonizador face aos ex-colonizados que se tornaram maiores, o reverso não é verdadeiro. Portugal e os portugueses não fazem parte do imaginário brasileiro como referência positiva. Apenas, como se sabe, como velhos e incompetentes colonizadores ou como imigrantes de mercearia e padaria (o que, em si, também é um estereótipo pateta - como todos os estereótipos). São Paulo, por exemplo, que para todos os efeitos práticos é a capital do Brasil e o seu motor, é uma cidade mista, brasileira; se fosse alguma outra coisa, seria italiana. Mas não é, definitivamente, portuguesa. Para o grosso da população brasileira, Portugal não é uma fantasia compensatória. É algo a que, pura e simplesmente, não se liga. Não digo isto nem com gosto nem com desgosto. É assim. A peça da SIC é apenas mais um exemplo da national delusion (fui eu que inventei, tá?) em que toda a gente, em todo o lado , vive. E, como em todo o lado, raia a imbecilidade.

mva | 21:24|
 

Bem-vindos à UE.

Uma colega polaca disse-me hoje que há pouco tempo atrás alguns dos seus estudantes da universidade local (Cracóvia) organizaram um evento sobre cultura lgbt. Fizeram seminários, eventos culturais na cidade e uma marcha, a primeira de sempre, com 1300 pessoas. Disse-me ela, que não é activista lgbt, que desde o Solidariedade não sentia uma onda tão boa. Mas: a marcha foi atacada por nacionalistas e fundamentalistas locais (com violência). E este não é o único "mas": dias antes a Igreja Católica telefonou ao reitor da Universidade questionando-o sobre o "patrocínio" do evento, pois o logotipo da instituição estava nos panfletos. O reitor retirou o logo, admoestou os responsáveis dos departamentos de sociologia e antropologia. Pede ela agora que académicos interessados nestas questões e activistas mandem livros, papers, informações, dicas. Sugeri-lhe um seminário conjunto Polónia-Portugal, para partilha da experiência da hegemonia católico-conservadora. Bem-vindos à Europa, querid@s polski!.

PS: Cracóvia é uma cidade linda!

mva | 21:17|
 

O país dos contrastes.

Sim, o horror existe. O que os neo-nazis do post anterior gostariam de fazer fazem-no certos legisladores dos EUA. O Estado da Virginia fez uma lei para impedir que surjam casamentos entre pessoas do mesmo sexo. Fazer leis "preventivas", e de sonegação (isto diz-se?) de direitos civis não é, infelizmente, coisa nova: fez-se nos EUA e na África do Sul, entre muitos outros países, para impedir o casamento entre pessoas de "raças" diferentes (sim meus queridos e queridas, isso já se fez e com o mesmo tipo de argumentos - não é natural, Deus não quis, caso contrário não teria inventado pretos e brancos, homens e mulheres...).

Como por acaso até conheço bem os EUA, aqui fica uma dica para quem queira viver lá. IN: Boston (e envolventes), New York, Vermont, extremo sul da Florida para quem tenha paciência para o domínio do Piroso, Chicago, San Francisco. OUT: Sul (começa em Washington e Maryland), Midwest, West (excepção: Santa Fé, certos circuitos de Austin, TX). Enclaves excepcionais: a maior parte das cidades universitárias e algumas estâncias balneares selectas.

mva | 21:10|


26.5.04  

Eles existem.

Hesitei em escrever este post porque acho que não se deve dar publicidade a fascistas. E talvez o referido "partido" não seja mais do que uma pessoa. Ou duas. Ou duas pessoas e um homófobo. Não sei. Mas a partezinha sobre a homossexualidade como se fosse um crime revela as crenças generalizadas de muita gente. A gente que, fruto da ignorância, depois se lembra de fazer estes partidos de vão de escada. Que lá permaneçam...

mva | 20:12|
 

«Peço desculpa por ter insinuado que o governo favoreceu os interesses de Carlucci, choro de pesar pela morte do herói nacional Xampalimô e agradeço eternamente todo o dinheiro que deixou para o avanço da investigação científica e a solução do problema da Saúde em Portugal» (Feranssiscu Lôssã)

Durão Barroso, afinal, nem sequer é muito inteligente. DB insiste em desmentir o favorecimento da Carlysle e de Frank Carlucci. Tendo Louçã insistido nas perguntas sobre o caso, DB acusou-o de ser "desonesto intelectualmente e insuportavelmente arrogante": A primeira expressão é um insulto, a segunda não é um pecado político pelo qual o deputado FL tivesse que justificar-se perante @s portugues@s. Na mesma linha, DB admoesta o Bloco (como já tinha feito o tal senhor que é o único Professor que há em Portugal e que fala muito numa televisão rasca)por não ter sido a favor do voto de pesar pela morte de Xampalimô...

Portanto: ou ele - DB - afinal nem sequer é muito inteligente (i.e., nem sequer tem condições para ser intelectualmente honesto), ou já escolheu mesmo entrar pela via do desespero demagógico.

mva | 19:34|
 

O fim da civilização como a conhecemos.

Ficámos a saber hoje que um quarto das crianças portuguesas nascem "fora do casamento". Já não bastava terem deixado de nascer em casa...

mva | 19:27|
 

VISTO.

Teknolust. (Eu ia escrever, anagramaticamente e sem querer, Teknoslut...). Nem a pretensão de ciberfeminismo o safa. Nem a pretensão de ficção-científica. Escolar, aborrecido, tosco. De resto, a pré-inauguração ontem, no Quarteto, do 8º Festival de Cinema Gay e Lésbico de Lisboa, foi bem agradável.

mva | 19:19|
 

É já segunda-feira...



...que a :2 (ou é 2:?)começa a transmitir Angels in America. Não percam.

mva | 19:15|
 

Novo blink.

Para um blog que diz estar "na intersecção da antropologia com a economia"...

mva | 19:11|


25.5.04  

Não será bem assim...


mva | 15:25|
 

Cerejas e alcatrão.

Saio do dentista, no Saldanha, e decido ir a pé até ao ISCTE, na Cidade Universitária (enfim... chama-se assim). Gosto de caminhar, sobretudo por avenidas largas e planas. Gosto, sobretudo, de flanar - de ver as pessoas anónimas, as montras, os prédios, sentir os sons, o ar e, mais que tudo, o feeling duma cidade. Uma sensação que se tem em Paris ou Barcelona (mas bem mais difícil de ter em Londres ou Roma, por exemplo). A ideia de cidades planeadas agrada-me mais do que a ideia de cidades "orgânicas". Agrada-me a racionalidade dos traçados rectilíneos, da sensação de domínio da natureza, de herança greco-romana, de iluminismo. Bem sei que estas coisas estão mal cotadas nos pós-modernos tempos que correm (mas será que ainda correm, esses tempos?). Pouco importa, outras modas se seguirão. As cidades "orgânicas" só se aguentam ou em turismo breve (quando são sentidas como "exóticas") ou se tiverem por trás um tecido social com exigência de decência (penso, respectivamente, em Nápoles e Copenhaga (ou Amesterdão)). Se não se permanecer e criar relações com pessoas, tornam-se insuportáveis; já numa cidade "contratual" qualquer um pode sentir-se bem - e ainda por cima criar também relações humanas.

Mas não é na Av. da República - ou em qualquer outra lisboeta - que posso ter essa sensação. A minha caminhada virou rapidamente tortura. Lixo, lixo, lixo. E cheiro a lixo, um cheiro que se está a tornar no cheiro de Lisboa e na causa provável da maior densidade de alérgicos que conheço; pedacinhos de Paris-nos-trópicos (alguns prédios dos inícios da abertura das avenidas novas) misturam-se com pedaços de Kinshasa; os passeios são estreitos, pejados de obstáculos, eternamente escavacados por causa da (in)famosa calçada à portuguesa e magoam os pés por causa dos constantes desníveis; as árvores definham; e há carros, muitos carros (paradoxalmente, haver muitos carros não é sinal de desenvolvimento; é justamente o contrário).E a fauna humana - eu incluído, que isto não é um post elitista... - nem se apercebe de como o seu ar triste tem a ver com "isto" que deixaram acontecer. Quando a famosa luz de Lisboa acontece, esquece-se um pouco "isto"; mas em dias cinzentos como o de hoje, a feiura grita. Olhem bem, da próxima vez que passarem por uma avenida lisboeta (até a da Liberdade, hoje em dia): não são simplesmente horrorosas? E não se poderia dizer que onde medra a feiura não pode medrar a democracia (com D grande)?

Viro para a 5 de Outubro. Apenas ligeirissimamente melhor. Numa esquina, um lugar de fruta sobrevive e vende cerejas. As primeiras do ano? Mesmo em frente, vários buracos no asfalto estão a ser tapados com alcatrão. As bolinhas laranja-avermelhado, luzindo debaixo do céu cinza, e o cheiro acre a alcatrão, negro e pegajoso. É o que fica de meia-hora de flanagem lisboeta.

mva | 12:13|


23.5.04  

VISTO.



Eternal Sunshine of the Spotless Mind. Não só ainda é possível fazer filmes novos, como afinal é possível olhar de forma nova para as histórias de amor.

mva | 12:42|
 

Quem se comove com as fotos de tortura não é homem nem é nada.

Leiam o editorial de hoje do Director do Público. Termina com a seguinte prosa: «Aceitar porém que a batalha está perdida na retaguarda é ceder à fraqueza (...). Porque estes são de facto os momentos em que se distinguem os que abandonam o barco dos que lutam até ao fim, mesmo quando a vitória parece impossível. Por isso, aos que fraquejam, recomenda-se a leitura de "Five days in London", de John Lukacs, onde se relatam as discussões no interior do gabinete de guerra britânico em Maio de 1940, depois da capitulação da França e da retirada caótica de Dunkerque. Debatia-se a hipótese de um armistício, cenário que, se nesse tempo se realizassem sondagens, teria por certo a preferência dos ingleses. Depois de violentos debates, Churchill ganhou e o Reino Unido não atirou a toalha. O resto da história é conhecida.»

Tudo parece resumir-se à velha retórica machista de homens que se aguentam versus homens que fraquejam; tudo parece resumir-se à velha retórica competitiva e bélica do ringue de boxe; e tudo é coroado com um exercício de ilógica, quando 1940, Churchill e Europa servem de termos de comparação (e legitimação) para 2004, Bush e Iraque.

mva | 12:25|


22.5.04  

Encontros no Parque Eduardo 7º.


A partir de Picasso, A Leitura da Carta, 1921.

Venho de uma sessão de autógrafos na Feira do Livro. A coisa está chocha. Só uma em 100 pessoas trazia um saco de compras na mão. O resto -. muita gente - passeava pelo parque. Os stands queixam-se que não vendem. Pensei na feira do livro de Gotemburgo do ano passado e na chusma de gente comprando e participando em debates tu-cá-tu-lá com escritores mundialmente famosos e prestando atenção a um grego, um esloveno e um tuga (eu...) numa sessão sobre ficção científica-política. Hoje, tive uma pessoa a pedir-me o autógrafo (e já me dei por feliz, considerando que não fui travestido de Margarida Rebelo Pinto): foi a pessoa por detrás do blog Panascas. Estou a gostar imenso deste jogo de conhecer em carne e osso as identidades virtuais. E mantenho o pacto de silêncio: não digo, nbão digo, não digo (o que é, quem é, como é).

PS: Porquê "7º"? É um statement: detesto a velharia da numeração romana.

mva | 19:00|
 

Há por aí alguém de jeito?

No meio de uma conversa de café na Feira do Livro, com uma pessoa que trabalhou na campanha de Sampaio para a CML há uns bons anos, apercebi-me de uma coisa: neste momento não há, à esquerda, ninguém que possa protagonizar uma nova geração de liderança com autoridade moral e ética, cultura, humanismo e carisma. Já só restam algumas pessoas da velha geração, saída ainda do republicanismo e/ou da resistência à ditadura. É triste: os 30 anos de democracia não produziram um equivalente contemporâneo (nas agendas, na linguagem) daqueles líderes. Esses já não servem, e os contemporâneos não os substituem plenamente. Isto vai doer quando chegarem as eleições presidencias e nos apercebermos que não há NINGUÉM para representar o "país de esquerda". Então vamos todos aperceber-nos da importância simbólica da Presidência.

PS: Este post é escrito por alguém que nem morto votará no Guterres...

mva | 18:54|
 

Parece que o PSD teve um congresso.

No congresso do PSD, Durão Barroso acusa o PS de estar a reboque do Bloco, de "um diácono Remédios de extrema-esquerda moralista". É curioso o ênfase dado a isto: significa que DB ficou mesmo aflito com a denúncia do negócio CGD/Galp/Carlysle; e significa que tudo o que seja exigência de transparência e rigor é remetido para o "moralismo" - uma espécie de acusação "de esquerda" feita pela direita à esquerda...

Um dia destes DB ainda vai dizer que temos que nos ver livres das pessoas que por aí andam reproduzindo os piores tiques mentais, políticos e demagógicos da revolução de 74-75. Mas há uma razão por que não pode dizê-lo: é que no topo da lista surgiriam os ex-esquerdista-moralistas Pacheco Pereira, José Manuel Fernandes e Durão Barroso...

mva | 18:47|
 

Parabéns.


"Fuga a Três Vozes". Acrílico/tela, 89X116 cm, 2004

Inaugura hoje nova exposição de Carlos Calvet, na Galeria Valbom. Uma vez mais, não vou poder estar (à mesma hora tenho tarefa com o meu Outros Destinos na Feira do Livro de Lx), daí os parabéns via blog. E também para o Daniel Barradas, que lançou hoje na FNAC Chiado o Cotãozinho (a desculpa é outra: sábado de manhã?!)

mva | 13:20|
 

Auto-análise de sábado de manhã.

Se alguém como eu gozar com a boda real espanhola é provável que alguém diga que se trata de snobeira de esquerda ou intelectual. Se perder tempo a ir ver um filme como Troy, é provável que alguém se admire com a escolha, com a demonstração de mau gosto ou com o facto de não ter boicotado um produto "americano". Acho este um tema curioso para pensar.

Acontece que ao mesmo tempo que gozo com a boda, vou acompanhá-la. Não por "interesse sociológico" ou "para me manter actualizado", mas sim porque gostarei de ver um bocado. Se estiver em casa, não vou manter a TV desligada de propósito e pegar no último livro do Saramago (o exemplo também não é lá muito bom...). É como poder gostar (e gosto) de ouvir uma música pimba, de ver um show de travestis cheio de estereótipos de género num bar gay (pimba camp), ou o festival da Eurovisão (pimba chic). No exemplo do Troy, vou ver coisas desse tipo sabendo à partida que não serão... grande coisa. Mas vou motivado pelas referências peplum, por referências do meu imaginário infantil e juvenil e, sim, porque pode ter graça ver a rapaziada semi-despida com mini-saias de couro...

Tudo isto para dizer o quê? Que há algo de horrível na coerência total, em ter um estilo, estética ou ideologia completos e herméticos. Somos processo e contradição. Somos feitos de influências as mais variadas. E somos capazes de ao mesmo tempo gostar de e criticá-lo. E em vez de sofrer com isso, prefiro deleitar-me com isso. Fico mais leve (um princípio hedonista)e sinto-me mais honesto (um princípio moral).

(Um exemplo mais hard: Também não vejo pornografia por "interesse sociológico", mas porque me excita. Mas tão-pouco passo a vida a ver pornografia; e ela não me impede de ver/ler outras coisas, que me "excitam" a outros níveis).


mva | 10:31|


20.5.04  

Boda-se!

As bodas - vulgo casamento - parecem estar na ordem do dia. Os telejornais vão lentamente abandonando a história de um golfinho doente no zoo (sim, é verdade, durante dias!)e concentram-se no casamento real espanhol, com um descaramento monárquico total. Esquecem-se, por exemplo, que no mesmo dia se realiza, em Vigo,a Marcha Mundial das Mulheres (mas, é claro, são aquelas que não casam ou cujos casamentos falharam, e não lindas locutoras de TV...) Ao mesmo tempo, não ligam nenhuma ao fenómeno dos casamentos de Massachusetts (mas, é claro, são casamentos motivados pelo "egoísmo" e são bizarrias da América...). Um pouco mais longe, um casamento iraquiano é literalmente bombardeado (mas, é claro, são casamentos de selvagens, onde disparam tiros em vez bagos de arroz). Estamos em plena "política da boda".

PS: O ataque ao casamento iraquiano faz-me pensar se não seria bom substituir a GNR por batalhões de secretárias de estado da Família e grupos pró-vida, famílias numerosas e defensores da santidade do casamento.

mva | 15:10|


19.5.04  

VISTO.

Troy. Uma xaropada violenta que, por ter sido feita hoje, nem sequer tem o charme dos peplum antigos. Consegue mesmo - e a tarefa é árdua - ser pior que Gladiator. Durante infinitas horas, uns rapazes americanos e australianos brincaram aos gregos antigos (quer dizer: com limites...)numa praia. Depois, uns outros rapazes menos apalpáveis e mais geekish empastelaram o resultado com cenas de batalhas geradas por computador. Por fim, este idiota foi ver o resultado.

mva | 10:22|


18.5.04  

MEDIAWATCH.



«CAMBRIDGE: Don Picard, 42, (left) and Robert DeBenedictis, 42, CEO and software engineer, Cambridge residents, two children, Carmen, 5, and James, 23 months. Together 12 years» (Globe Staff Photo / Dina Rudick) Há muitas e muito bonitas fotos no Boston Globe e no New York Times. E vejam as reportagens de TVs americanas aqui, e também aqui na Glad!

mva | 12:22|
 

Sei que estás em festa, pá...

Amigos em Cambridge, Mass. (um casal hetero, por sinal), disseram que a festa foi rija. Entre outras coisas, parece que as buzinadelas não pararam. Em Lisboa, buzinadelas ouvi-as, mas eram pelo Benfica. As mesmas "buzinadelas" a que os noticiários das TVs prestaram atenção ad nauseam. Nem uma referência aos casamentos de Mass.

Esta "obsessão" com os casamentos é apenas coisa de gay? Creio sinceramente que não deve ser. Trata-se provavelmente do segundo mais importante debate na sociedade americana, depois do Iraque. Porque se trata de um debate civilizacional, quer para os apoiantes, quer para os detractores. As eleições presidenciais vão mesmo ter este como um dos temas centrais.

Sendo os EUA, quer se goste quer não, a "locomotiva do mundo", o que por lá se passa deveria ser do interesse de toda a gente, sobretudo dos media. Mas não é: o casamento de Felipe e Letizia é muito mais importante - justamente por razões civilizacionais (isto é, é uma tomada de posição claríssima no debate civilizacional sobre direitos e igualdade sexuais).

No caso português, ainda poderíamos - embora de forma provocatória - dizer que na área metropolitana de Boston (incluindo o mini-estado de Rhode Island) se encontra uma das maiores e mais históricas concentrações de luso-americanos e imigrantes portugueses. Quantos casais "LusoGay" e "LusoLes" não estarão nas filas para a licença de casamento? Cadê os repórteres "lusos"?

Provavelmente toda a atenção se desviará para as incríveis declarações dos responsáveis do PS francês e os seus argumentos tardo-católicos sobre o "egoísmo" de quem quer ter crianças. Isto é, o "egoísmo" dos gays e lésbicas, pois a procriação e a adopção hetero são "naturalmente" actos altruístas merecedores de todas as medalhas da République...

Se calhar é a idade: começo a perder a paciência e começo a entrar no que chamo o "mode sionista" - ocupa-se o Cape Cod, ou a Gran Canaria, ou Mikonos, ou um troço da Austrália e faz-se um país lgbt. Onde os heteros poderão viver em paz, sem serem "palestinizados". Mas onde os lgbts possam viver com dignidade - não só sem a perseguição dos homófobos, mas também sem o paternalismo insultuoso dos positivistas e muito pouco "iluminados" filhos da Revolução Francesa.

mva | 11:51|


17.5.04  

Já está.


«Susan Shepherd (right) and Marcia Hams (center) celebrated today after becoming the first same-sex couple to apply for a marriage license in Massachusetts». (Globe Staff Photo / Dina Rudick). Mais no Boston Globe.

mva | 10:13|


16.5.04  

Infelícia.

Eu nem queria falar do assunto. Não queria estragar a festa de amanhã pelas bandas do Cabo do Bacalhau, no outro lado da Grande Poça. Mas a reportagem de Felícia Cabrita na Grande Reportagem do DN (e na SIC, outro dia) não pode passar despercebida. Não há liberdade de opinião, nem critério jornalístico que justifique a completa ausência de noções básicas de cidadania, igualdade, democracia e pluralismo no trabalho de Felícia Cabrita. É simplesmente repugnante que a reportagem confunda homossexualidade com pedofilia e com a introdução da sida em Portugal. Poderia FC vir dizer que "factos" são factos: que aqueles homens californianos são homossexuais (sim, e depois?, qual a relevância desse descritor?; que tiveram sexo com rapazes da Casa Pia e que isso é pedofilia e homossexualidade (wrong! O verdadeiro problema (e crime e nome para a coisa) é o abuso sexual de menores), e que os casos de sida surgiram em casapianos depois disso (um maravilhoso salto lógico, para mais alimentador da noção xenofóbica de que a sida é uma coisa do Outro e que só poderia ter chegado até nós, os Puros, através da "contaminação" do estrangeiro; só falta descobrir que os californianos eram judeus...).

O espírito justiceiro de que FC se tem vindo a auto-investir, por provável e louvável empatia com os mais explorados (e contra o sistema clientelar, patriarcal e hipócrita de que beneficiam as nossas "elites"), não justifica nem por um segundo a ajuda que dá à perpetuação da homofobia. Com certeza que Felícia Cabrita conhece (e se calhar é amiga de) homossexuais que não vêem a sua sexualidade como "um vício", que não são pedófilos, que nem sequer recorrem à prostituição e que provavelmente tomam muito mais cuidado com a transmissão de doenças sexualmente transmissíveis do que muitos heteros. Mas faz o "erro" clássico de estabelecer, na sua mente, uma distinção: esses são os meus amigos,com nomes próprios, os outros são os monstros, os que cabem na categoria tenebrosa de "homossexuais". É esta distinção que reproduz a homofobia entre os grupos, classes e profissões que, como os jornalistas, mais obrigação tinham de serem promotores de uma cidadania rigorosa.

Precisamos de nos zangar, e muito, e com muita força. E Felícia Cabrita precisa, no mínimo, de escrever uma nota no DN onde peça publicamente desculpas (não o teria feito se, por exemplo, o seu artigo tivesse um teor antisemita, por inadvertido que fosse?) às pessoas ofendidas - os homossexuais concidadãos de FC - e vêem as suas dificuldades quotidianas exacerbadas pelo apoio de artigos deste teor (porque nem todos os homossexuais são diplomatas, Felícia: há-os absolutamente desprovidos de poder, do canalizador ao jovem dependente dos pais).

E o DN, ou a Grande Reportagem, precisam de fazer o mesmo. É que já chega: estamos no século XXI, num país da União Europeia e vocês, Felícia Cabrita e responsáveis da GR e do DN, não são obscuros redactores de obscuras folhas paroquiais: vocês são a elite deste país. E numa democracia isso significa acrescida responsabilidade na defesa da cidadania.

Finalmente, uma sugestão de férias para FC: pegue num avião para Boston; alugue um carro e vá até P'Town. Vá à praia, sente-se num café, leia o jornal local, fale com as pessoas, vá a um casamento. Vai ver que no regresso terá percebido que a sua arma - as palavras - são a coisa mais poderosa que há. A usar com extrema cautela.

mva | 16:53|
 

Mais África.

A Sara reagiu, e muito bem (como de costume) ao meu post sobre o Agualusa. A questão da África na memória de muit@s portugues@s contemporâne@s é o típico assunto tenso e denso que normalmente fascina os antropólogos mais modernos. Porque junta a questão emocional das biografias e histórias de família, com questões sociais e políticas da história recente: o colonialismo, a descolonização, o racismo, a experiência da alteridade, da hibridez, e tantas outras. Nestas coisas, desgostam-me os programas ideológicos, quer do tipo a armar ao lusotropical, quer do tipo esquerdista que mete no mesmo saco de gatos do colonialismo os políticos e as pessoas comuns. A forma mais rica e produtiva de construirmos uma narrativa colectiva sobre "a questão" é não construirmos uma narrativa colectiva, mas sim múltiplas estórias de pessoas, famílias, viajantes - e de todos os quadrantes identitários. É isso que a auto-análise da Sara faz. E é isso que as estórias do Agualusa fazem. A fronteira que separa isto dos álbuns que agora se vendem, do tipo "Postais de Lourenço Marques" é, sem dúvida, ténue. Mas seria bom que mais gente se arriscasse a exercícios de memória e de recuperação de memórias familiares. Entre outras coisas bem mais importantes (o sentido de identidade pessoal de cada um e cada uma), talvez começássemos a perceber melhor o que se passa hoje num país com uma tão alta percentagem de pessoas que "passaram por" ou viveram em África e com cada vez mais imigrantes das ex-colónias. Porque sem dúvida estas experiências acumuladas alimentam a forma como o país se vai representando a si próprio como pós-colonial e como representa (ou não)os "Outros cá dentro"... Em suma, não podemos deixar este trabalho de representação nas mãos quer dos ressentidos, quer dos continuadores do colonialismo por outras vias.

mva | 16:38|
 

Pornex.

O que resta da Pornex já está on-line. Oh, sweet bird of youth... (chuiff).

mva | 16:36|
 

P'Town.



Provincetown (ou P'Town), no extremo do Cape Cod em Massachusetts, é um dos meus locais favoritos no mundo. Um dos locais de chegada dos Pilgrims (e um dos locais de confronto com os Wampanoag...), P'Town foi, todavia, povoada por portugueses no tempo da caça à baleia - e por caboverdianos, pela mesma razão. Ainda hoje é uma cidade "portuguesa", se bem que na parte mais pobre e envelhecida. Ao longo de todo o século XX tornou-se num local de vilegiatura de boémios e boémias (contando-se entre eles quase todos os escritores americanos de que já se ouviu falar...). Mas P'Town é hoje a cidade com a mais alta percentagem de grupos domésticos constituídos por casais do mesmo sexo. Passear pelas suas ruas é ver a bandeira portuguesa e a do arco-íris hasteadas lado a lado pelo município. Quem diria?! Amanhã P'Town vai fervilhar - e morro de pena por não estar lá...

mva | 16:26|
 

É já amanhã!



«O Supremo Tribunal de Justiça norte-americano recusou bloquear os casamentos entre homossexuais em Massachusetts, permitindo a este Estado tornar-se no primeiro do país onde os casamentos legais serão autorizados. O Supremo Tribunal decidiu, na sexta-feira à noite, não dar seguimento a um recurso de grupos conservadores para impedir as uniões "gay", um esforço que também já tinha sido negado por um tribunal de menor instância. A decisão abre caminho aos casamentos legais de casais do mesmo sexo, já a partir de amanhã, tal como tinha sido estabelecido em Novembro de 2003 pelo Supremo Tribunal do Estado de Massachusetts, em nome da igualdade de direitos. O veredicto foi produzido na sequência de uma queixa de discriminação apresentada por sete casais de gays e lésbicas» (Público)

Amanhã começa a "batalha campal". Dê para o que der, viva a Commonwealth of Massachusetts!

mva | 12:10|


15.5.04  

VISTO.



Kill Bill, Vol. II. Não tinha vibrado com o Vol. I, por ter achado pouco creativo o pastiche pós-moderno. Mas, neste Vol. II o filme como que "assenta" em convenções mais... convencionais (ainda que continuem a ser citações), e ganha espessura. A Uma Thurman é, para mim (aqui como em muitos filmes...) a chave, o segredo da receita. Infelizmente não encontrei em lado nenhum uma foto da última imagem do filme: a preto e branco, guiando um carro, em grande plano, ela pisca-nos o olho, ever so slightly...

mva | 17:32|
 

LIDO.



Catálogo de Sombras, de José Eduardo Agualusa. Por vezes acho estranho gostar dos seus livros, mas gosto. Porque acho estranho? Porque, em princípio, um lado preconceituoso meu reagiria à temática da lusofonia, do "mundo em português" e até mesmo da nostalgia europeia por África. Só que o JEA assume a sua ligação a esses temas e faz dela o objecto da sua busca: com honestidade, com economia e com força. O resultado é que sentimos/aprendemos com eles. À semelhança do que acontece com Ruy Duarte de Carvalho ou o Pedro Rosa Mendes de A Baía dos Tigres. É o nosso trabalho pós-colonial em marcha.

mva | 17:25|


14.5.04  

A homofobia é uma SICness.

Jornal da Noite da SIC, há minutos. A peça de Felícia Cabrita sobre a hipótese de a pandemia da sida em Portugal ter começado na Casa Pia até que teve o cuidado de não misturar homossexualidade com pedofilia (e sida, já agora...). Mas Rodrigo Guedes de Carvalho apresenta a peça dizendo que a sida foi introduzida ali "por membros da comunidade homossexual americana".

A revolta e a sensação de orfandade que sentimos perante este tipo de insulto não vem só de ouvir o âncora de uma TV generalista dizer isto. Vem também de sabermos que não há NINGUÉM, ao nível do Estado, da Justiça ou da Comunicação Social que, em Portugal, e ao contrário de outros países da UE, controle, admoeste e puna este tipo de homofobia.

mva | 21:31|
 

Os pais não lhe prestaram atenção suficiente.

Fórum Mulher, na TSF. Oiço a primeira intervenção, de uma senhora das "Famílias Numerosas". Diz ela que (eles já aprenderam uma estratégia a que se poderia chamar "heterossexismo preventivo")«uma família é um homem e uma mulher com crianças» e que «o que agora se chama famílias monoparentais nós chamamos grupo doméstico». A jornalista pergunta-lhe se ela acha que uma mulher com um filho não é uma família. Resposta: "Bem, se ela tiver enviuvado, é...". Para não estragar o dia, recusei-me a ouvir mais.

mva | 20:22|
 

Ageism.

Estava a preparar uma aula sobre ageism (discriminação com base na idade, sobretudo dos velhos) para a minha cadeira "Identidades e Discriminações" e apercebi-me de que talvez não exista palavra em português. Parece-me que a tradução correcta seria "etarismo", de "etário". Que vos parece? Pomposo demais? Já estará fixado um termo? Aceitam-se dicas.

mva | 17:32|
 

Querido Partido Socialista:

Knock, knock! Hello? HELLO? HE-LLO? Anybody home? O PSOE vai tratar dos casamentos gay e lésbicos (i.e., vai tratar da igualdade); o PS Francês parece que também vai fazer o mesmo (i.e., vai tratar da igualdade). E o PS Português? Bem..., hummm, o PS..., bem, o PS nem diz que vai pensar. O PS nem sequer tem um grupo lgbt no seu seio. Nem sequer a JS o tem.

O problema é que vai ser muito difícil usar a velha desculpa relativista de que este país é diferente, tem a cultura que tem, etc. Se calhar o PS vai tentar convencer-nos de que a Espanha e a França são países escandinavos, de religião protestante, com democracias muito antigas, e que não são "latinos". (Ah, os maravilhosos fiordes gelados da Provença! Ah, o delicioso smorgasbord que se come nas tascas de Badajoz!)

mva | 13:48|
 

VARIA.

*Pacheco Pereira lança o contra-ataque às denúncias da tortura de prisioneiros no Iraque relembrando as torturas no Verão quente pós-25 de Abril. Para quê? Para dizer que a esquerda tem telhados de vidro no assunto. Não percebo. É claro que aqueles actos foram intoleráveis. E é claro que quem os cometeu deveria ser julgado. Mas em que é que isso retira gravidade ao que está a acontecer no Iraque?

*Lula expulsa um jornalista do New York Times do Brasil. Para tal recorre a uma lei do tempo da ditadura militar. Das duas uma: ou Lula estava mesmo bêbedo, ou o projecto político em que se depositava esperança já morreu de vez.

*Já perceberam o horror que aí vem? Reposição de fronteiras, leis especiais, limitação de liberdades, vigilância policial de todos os tipos. Para não falar do horror já instalado: bandeiras nacionais vendidas em pacotes Luís Figo por grandes empresas de comércio a retalho. É o nacionalismo, o futebolismo e o capitalismo de quitanda unindo os seus esforços (ou tornando claro que sempre uniram os seus esforços...).

*Uma reportagem sobre a Estónia mostra como um terço da população, os russófonos, não tem cidadania e não consegue obtê-la se não passar num exame de língua estónia. A ministra dos estrangeiros local acha isso normal. Aparentemente, na Estónia cultiva-se muito a língua, o folclore, as "tradições", numa espécie de nacionalismo de pequeno país, um pouco à maneira da Sildávia do Tintim. Esta é uma velha tradição europeia, iniciada depois da queda do Império Austro-Húngaro, promovida por escritores românticos e antropólogos de há 100 anos. Triste é constatar que tanta gente ache normal que, no século XXI e na UE, a cidadania passe pela nacionalidade, e a nacionalidade se defina pela consonância a um padrão que só existe na pequenez das cabeças.

*Parece que vai haver uma fundação de investigação médica (liderada por Leonor Beleza!) com dinheiros de Champalimaud. Agora não se riam e leiam o nome: "Fundação Dona Ana de Sommer Champalimaud e Doutor Carlos Montez Champalimaud". É a FDASCDCMC. Imaginem um candidato americano a escrever o nome da coisa; ou a procurar o site da coisa. Não era melhor algo como "Fundação Com Os Nomes Dos Meus Pais Para Perceberem Como São Pomposos E Como As Elites Portuguesas Vivem Na Idade Média"?

mva | 13:29|
 

20 anos de Pornex.



Ele é o livro novo do Rui e a referência aos Felizes da Fé. Mas há mais: não é que ontem a Leonor e eu descobrimos que este mês celebram-se 20 anos (O.M.G.!)de Pornex? O Rui e a Leonor (e eu dei uma ajuda, nomeadamente com umas pinturas very graphic),quando andávamos na FCSH-UNL, lembraram-se de fazer uma exposição sobre pornografia. Foi um sucesso. Por muito que fosse brincadeira/provocação, a verdade é que mostrámos mesmo pornografia. Depois, na &Etc, publicaram-se as "actas" (ainda se devem encontrar nalgum alfarrabista...). A coisa deu escandaleira: como é que aqueles bons alunos faziam aquilo? Seria porque era paródia? Performance? Happening? Análise académica do porn? Bem, não. Era atitude: se consumíamos, deparávamos com e eventualmente gostávamos de porno, então assumiamo-lo. The politics of transparency, I guess.

mva | 13:01|
 

Felizes.



A propósito do lançamento do livro do Rui Zink, ontem a Leonor Areal e eu estivemos num visionamento do seu filme (dela) Geração Feliz, sobre o movimento Felizes da Fé, inspirado pelo Rui (e seguido em S. Francisco pelo Rigo, de que falei posts abaixo) que agitou as ruas nos finais dos 80 e inícios de 90. Fiquei espantado - mas bem espantado - com o interesse dos jovens pela coisa. E caí na real quando me vi a ter que dar explicações sobre o que foram os oitentas, o cavaquismo, and so on. Talk about getting old! Como resumo de geração, é simples: já não éramos "da geração de sessenta" e do revolucionarismo pós-25 de Abril, mas ainda não éramos (nem viemos a ser) yuppies ou neo-liberais. Daí essa espécie de experimentação com o pastiche, o bricolage, a BD, a série B, a cultura pop, etc. A ideia, no fundo, era que os Grandes Programas Ideológicos de Transformação do Mundo não nos interessavam, nem o Pensamento Único Neo-Liberal. Andámos por ali (in)felizes durante uns tempos, às apalpadelas - e ainda andamos.

mva | 12:49|
 

Dádiva Divina.

O Rui Zink lançou ontem um novo livro, Dádiva Divina. Já tinha lido o manuscrito e gostei: o vai-vem entre o humor e o drama, e de novo o humor, que caracterizam o seu estilo, estão bem presentes. O que não está presente é um site das Publicações Dom Quixote: impossível de encontrar facilmente através do Google. Quando finalmente encontro algo que se assemelha, a Novis não me deixa entrar no site. Eu só queria ir à procura de uma imagem da capa do livro, mas nem sequer a editora encontrei. Viverão os livreiros portugueses na idade da pedra?

mva | 12:30|
 

Ano Novo.

Pronto, já chega de aniversário. Back to business. Mas não sem antes agradecer ao Boss, que foi quem ofereceu o lindo azul. Tem dado uma ajuda incrível ao nível do html (recorrendo também ao SWM, a quem agradeço também). Não mudei muito mais - acho que prefiro a "evolução" à "revolução"...

mva | 12:25|


13.5.04  

385 posts depois, este blog faz um ano.

mva | 10:51|


12.5.04  

MVA

Pois é, só outro dia, quando recebi um simpático convite de trabalho do Manuel Valente Alves, percebi que havia outro MVA, e este com um site lindíssimo de produção artística. Vale a pena ver.

PS: Estou desejoso de ver se existe um site da Marina Vanessa Andrade, do Marquês de Villa Alta, ou mesmo, quem sabe, dos Massachusetts Valium Addicts...

mva | 14:54|
 

Senhor, tem piedade dos que vêem mulheres em cima de árvores.



Amanhã, além da importantíssima efeméride do 1º aniversário deste blog, milhares de portugueses atropelar-se-ão em Fátima, à semelhança dos milhares de muçulmanos que anualmente se atropelam em Meca.

mva | 14:16|
 

MEDIAWATCH.

Chamaram-me a atenção para a secção "Vox Populi" do Público de há dias. Um homem de cinquenta e poucos, respondendo à pergunta sobre se algum membro do governo deveria ser afastado, dizia que sim, o Paulo Portas, que nem deveria ter entrado, "pelas razões que toda a gente sabe mas ninguém quer dizer". Acho que é difícil encontrar melhor exemplo da mecânica dum preconceito que bem conhecemos... (oops, e aqui estou eu a dar outro exemplo).

Entetanto, num DN por estes dias, um ex-membro da Comissão de Ética para as Ciências da Vida, comentava o facto de haver rapaziada universitária a vender esperma, "sem ser por razões altruístas". Logo de seguida, comentava a venda de gâmetas femininos como uma forma de venda do corpo, "de prostituição". Os rapazes são apenas estouvados, as moças são putas. Este é um exemplo da mecânica de outro preconceito, o sexista.

Hoje, por fim, li que Durão Barroso vai adiar a visita oficial ao México, onde iria inaugurar a cátedra Saramago em Guadalajara, por causa de um jogo de futebol português numa cidade alemã impronunciável. Quando finalmente ele lá for, espero que nuestros hermanitos lhe digam que não o podem receber porque há uma tourada importantíssima em Chapultepec de Bajo ou Texnocoacoatlitlan de Arriba.

mva | 14:06|
 

LIDOS E VISTOS.

O Livro de Bolso do Weblogue, de Rebecca Blood, na Campo das Letras. Para quem precisa de folhear para aprender a navegar.

Sylvia. Melhor é ler os livros de Sylvia Plath do que ver este filme. Aparentemente baseia-se na versão do marido, "desautorizada" pelo facto de Sylvia estar morta. O senhor achava com certeza que era o centro do mundo dela, pelo que o filme fica marcado pelo tipo de romantismo trágico tão caro à masculinidade hegemónica...

Get Real, Caricias e School of Rock. O primeiro é um bocado - como diria uma amiga minha - "chaleco", embora fosse excelente para apresentar nos liceus, de modo a promover o coming out de milhares de jovens aflitos. O segundo é bem pior do que o fabuloso Morir o no, do mesmo Ventura Pons. Se calhar o que mais me irritou foi ter que ouvir o filme dobrado em castelhano, com os lábios mexendo-se claramente em catalão. O terceiro é bem divertido, gozando com o género "professor que muda a vida de alunos prematuramente aniquilados como ser humanos"...

mva | 13:46|
 

Varia.



Quando foi do Feher ainda houve a desculpa de ter sido uma morte em directo. Agora, com o jovem Bruno, trata-se de puro tabloidismo. Se calhar, para perceber melhor o "fenómeno futebol", seja bom assistir ao seminário "Futebol, Ciências Sociais e Imagem", no ICS, dias 13 a 15, organizado pelo CEAS.

Entretanto, inaugurou a Mabooki, livraria da minha amiga Lívia Apa, napolitana-lisboeta-africana de gema.

mva | 13:30|


11.5.04  

They live!



They são os ácaros. Os pequenos monstros atacaram-me em força, deixando-me breathless e... blogless. Graças a potentes drogas, amanhã à tarde já haverá posts novos. Resmas deles. Postas.

mva | 19:12|


9.5.04  

Iconografia da Guerra.

Se o século XX pode ser narrado com esta fotografia...

[Robert Capa, 1936, Guerra Civil de Espanha],

com esta...

[Criança no ghetto de Varsóvia, II Guerra Mundial],

e com esta

[Nick Ut, 1972, Criança queimada por napalm, Vietname],

...o século XXI já tem uma:

mva | 11:51|


8.5.04  

A temperatura a que arde a liberdade.



A Disney impediu a sua subsidiária Miramax de distribuir o filme de Michael Moore Fahrenheit 911. Aparentemente a Disney ficou com a herança do sr. Walt, cujas simpatias com os totalitários alemães ficaram conhecidas. Pode-se viver numa democracia política e, ao mesmo tempo, num sistema totalitário empresarial, assente na liberdade de as empresas fazerem rigorosamente o que querem. No campo da "indústria das representações", a coisa pia ainda mais fino.

PS: Fahrenheit 451, de Truffaut (1966), a temperatura a que ardem os livros, baseado em Fahrenheit 451, de Ray Bradbury (1953)

mva | 12:58|
 

Rigo.



Segundo o Público, Rigo está de passagem na Zé dos Bois, com três artistas de três nações native american. Rigo, mais um caso de fuga de cérebros (desta feita no campo artístico), levou a "dinâmica" dos Felizes da Fé (link ao lado) para os EUA. E em S. Francisco fui também encontrar trabalhos dele ao passear nas ruas, como nesta foto que tirei em 2002.

mva | 12:35|


7.5.04  

Amazing Trouts.

Ontem conheci uma das pessoas que assina o Amazing Trout Blog. Conheci essa pessoa fazendo uma actividade artística nada virtual - e fazendo-a maravilhosamente. Mais não posso dizer sem a autorização da pessoa. Mas garanto-vos que a distância que vai dos nicks e da virtualidade para o mundo da realidade carnal é um caminho de surpresas.

I wonder if o nome daquele blog tem alguma coisa a ver com o único Trout (fora o peixe) que conheço: o Kilgore Trout, personagem fascinante de um dos meus autores favoritos, o Kurt Vonnegut (que, há décadas, apresentou um dos seus romances como tese de Antropologia em Chicago e viu-a recusada, nesses tempos pré-pós-modernos...)

mva | 11:29|
 

De Cabo a rabo.

A TV Cabo é o meu monopólio - perdão, a minha empresa - favorita. Quando mudei de casa tive o privilégio de conhecer, ao vivo, e por telefone, cerca de duzentos e trinta e nove funcionários; abriram-me meia dúzia de contas sem as ter pedido; propuseram instalar o "serviço" umas dezassete vezes, e em meia dúzia de moradas, quase todas inexistentes. É uma empresa muito divertida. Depois, dedicam-se a "oferecer" o que eles chamam "novos canais", que é uma forma caturra de não ter que explicar porque desaparecem outros tantos.

Mas as moças e os moços do trabalho precário - porque um grande monopólio, perdão, empresa, não tem dinheiro nem visão social para dignificar os seus trabalhadores - ficam sempre muito espantados com a minha reacção. Como é que se lida com um sujeito que diz que não quer um canal de filmes de "acção"? Que não tem o mais pequeno interesse no canal de futebol porque o futebol lhe entra pela casa adentro nos outros canais todos? E - espanto dos espantos - que não quer o Sexy Hot porque não gosta daquela pornografia. (Normalmente a conversa pára quando ele lhes diz qual a pornografia de que, essa sim, gosta, só que a TV Cabo não oferece...).

Mas é divertido: uma pessoa sempre vai tendo uns telefonemas e passa uns momentos de boa camaradagem. Bem hajas, TV Cabo, adoro-te de fio a pavio, perdão, de cabo a rabo.

mva | 11:03|
 

MEDIAWATCH.
Mamíferos: Tamanho do Pénis Varia Consoante a Latitude

Nós já sabíamos que a Ciência era uma actividade marcada pela dominação masculina. Já sabíamos que se perderam anos e anos a tentar mostrar que as mulheres são uma versão inferior do homem e que os homossexuais são doentes. Só não sabíamos que, nos tempos livres, os rapazes andavam mesmo a medir as pilas.

PS: É muito provável que, graças ao Google, este post resulte num boom de visitas a este blog...

mva | 10:56|
 

Feminista.



"Construamos em 2004 a base de um documento para a acção feminista. Chamemos-lhe manifesto feminista, proclamação para a acção feminista ou, porque não, carta feminista." , disse ontem Manuela Tavares no Seminário Evocativo do Primeiro Congresso Feminista e da Educação. Foi em 1924. Estamos em 2004, e o país está cheio de mulheres que dizem barbaridades como "sou feminina mas não feminista" ou "sou feminista mas feminina" (isto não é citação de ninguém em particular...). A Manuela tem toda a razão. E com certeza apercebeu-se que o primeiro grande gesto de um documento desses é assumir o nome "Feminista".

mva | 10:44|


5.5.04  

Hummpff...


[Miquel Barceló, Biblioteca, 1983]

Esmagado com/por trabalho e tricas. Chuva. Paragem cardíaca metafórica. Brainstorm no mau sentido. (Oh, get a life, will ya?!)

mva | 23:10|


4.5.04  

mva | 12:31|
 

Os ecologistas morais.

Ontem, no DN, o nosso querido César das Neves e hoje no Público o mui-junto-pela-vida António Pinheiro Torres. Ambos começaram a campanha de desautorização da alteração do artigo 13 da Constituição, na sequência da declaração de voto de vários deputados do PSD (pode ser lida, por quem tiver estômago, no Diário da Assembleia da República nº 79).

O que toda esta gente faz - mesmo aqueles que, contraditoriamente, votaram a favor da alteração do artigo (!) - é dizer que não se pode esperar qualquer legitimação do casamento lgbt ou da adopção lgbt com base na alteração constitucional. Como dizer isto implica cambalhotas lógicas de partir as costas, refugiam-se sempre no mesmo "argumento": a "Natureza".

Convém dizer de uma vez por todas que essa coisa da "Natureza" não existe. Que é, por vezes, uma palavra-código para Deus (portanto só aplicável a quem é crente); por outras, uma palavra-código para "tradição" (portanto, uma questão de escolha por parte de quem se considera tradicionalista); e quase sempre uma afirmação de anacronismo e/ou de etnocentrismo (confundindo um certo arranjo da sociedade, num certo lugar e tempo, com a universalidade - coisa bastas vezes descomprovada, nomeadamente pela gente da minha profissão).

O que esta gente faz com o argumento do natural e do anti-natural é pura promoção da ignorância, manipulação das consciências e totalitarismo: o que querem fazer não é salvaguardar interesses de terceiros (a declaração de voto chega ao ponto de confundir explicitamente homossexualidade e abuso de menores, ao dizer que o artº 13 não pode pôr em causa os artigos contra o abuso de menores (!)), mas sim, claramente, garantir a exclusão da cidadania e da igualdade a um segmento da população.

Para que conste doravante, são os seguintes os nomes dos activistas pela limitação dos direitos civis e da igualdade:

«Os Deputados do PSD, Isilda Pegado, Rui Gomes da Silva, Costa e Oliveira, Pereira da Costa, Bernardino da Costa Pereira, Abílio Almeida Costa, Carlos Sousa Pinto, Carlos Rodrigues. Bessa Guerra, Rui Miguel Ribeiro, Pinho Cardão, José Manuel Alves, José António Silva, Miguel Miranda, Paulo Batista Santos, João Carlos Barreiras Duarte, António Nazaré Pereira, Maria João Fonseca, Henrique Chaves, Daniel Rebelo, Pina Marques, Cruz Silva, Eugénio Marinho, Diogo Luz, Luís Campos Ferreira, João Gago Horta, Luís Montenegro, Isménia Franco, Gonçalo Breda Marques, Luís Cirilo, Goreti Machado, Correia de Jesus, Joaquim Ponte, Miguel Raimundo, Natália Carrascalão, António Pinheiro Torres — e mais oito assinaturas [sic]».

mva | 11:52|


3.5.04  

O.M.G. (Oh, my God!)

Quando a ouvi nem acreditei: Manuela Ferreira Leite disse "Deus nos livre de ter os socialistas no governo outra vez; que Deus livre Portugal...(etc.)". Que a senhora acredite em dEus (thanks, Sara) é certamente lá com ela (e com dEus, coitado). Mas a senhora é ministra do governo de um Estado laico.

Quando entrouvi (giro, não é?) que Sousa Franco, candidato do PS às Europeias, entrara em polémica com ela por causa disso, parti do princípio que era por causa dessa questão da laicidade. Qual quê. O senhor quis foi polemizar sobre as responsabilidades PS/PSD na "crise". Já nem o famoso republicanismo laico do PS lhes serve de inspiração?

A minha brevíssima e casual educação religiosa pelas bandas do judaísmo ensinou-me que o nome de dEus, mais do que não poder ser invocado em vão, não deve sequer ser pronunciado. Ferreira Leite faria bem em seguir mais os ditames judaicos do que cristãos no dueto "judaico-cristão". Mas parece que o que agora está na moda é a "estética Bush" - daqui até "dEus abençoe Portugal" já deve faltar pouco...

PS: E a pastilha de Paulo Portas, estava abençoada? Como diriam os espanhóis: "Hostia!"

mva | 11:17|


2.5.04  

Ratinho.

Um visitante queixou-se do cursor da Comet e pediu-me que o retirasse. Gostava de saber se muitas mais pessoas têm problemas com o dito animal que corre. Se as respostas forem muitas eu devolvo-o à toca. Entretanto, o Boss tem sido hiper-prestável a sugerir alterações ao template para não ficar igual ao de alguns "bushistas". Também gostava de saber se os ditos se importam por eu ter um template igual ao seu? No dia 13 (et pour cause) este bloguito faz 1 ano - e então poderei fazer algumas mini-alterações.

mva | 17:42|
 

mva | 17:33|


1.5.04  

T&T.

Nunca tinha encontrado um blog com o mesmo template que o meu. Numa busca por blogs da Trinidad, dei logo de caras com um. Agora vou manter-me em contacto com aquele país que também faz parte da minha lista pessoal de "terrenos" (ainda trabalhei um bom pedaço sobre T&T, como por lá se diz).

mva | 16:39|
 

1º de Maio.


Les Constructeurs, F. Léger (1950)

mva | 13:24|
 

Campo das Letras.

A editora já tem o seu novo site a funcionar (quando anunciei o meu Outros Destinos, o link conduzia a nenhures).

mva | 12:36|
 

Flag Wars.

Este é um assunto que me interessa muito, até em termos de pesquisa: como "cruzar" variáveis de identidade e discriminação na análise das mudanças sociais e mesmo assim "fazer cidadania". O documentário Flag Wars, que ainda não vi, parece abordar esse assunto, ao mostrar a difícil equivalência entre racismo e homofobia se não se considerar a variável da classe social. O problema é particularmente grave nos EUA, onde toda a cultura política vai no sentido de negar a ideia de classe (a antropóloga Sherry Ortner tem um excelente livro sobre isto). Mas cá poderá acontecer algo de semelhante graças a outro fenómeno: o cansaço das gerações mais novas com a política tradicional de esquerda e dos sindicatos, e a atracção dos movimentos de política identitária. É por isso que continua a ser relevante pensar (também, pois não substitui o movimento mais abrangente) numa "esquerda gay",em plataformas que reunam os diferentes movimentos anti-discriminação, e numa esquerda que dê a estes assuntos a mesma importância.

mva | 12:22|
 

Venham mais dez.

Sejam então muito bem-vindas, Estónia, Letónia, Lituânia, Polónia, Chéquia (por que raio há-de ser "Répública Checa"?), Eslováquia, Hungria, Eslovénia e Malta; e bem-vindo, Chipre - o único gajo, por sinal mal comportado e dividido. Mais uns três anos e será a vez da Roménia e da Bulgária, pesadas moçoilas balcânicas. Considerando que tanto a Islândia, como a Suiça e a Noruega já estão no Espaço Económico Europeu (são umas tias ricas que apenas se recusam a conviver demasiado com a criadagem), o berbicacho vai começar quando se tiver que decidir o que fazer com o que resta dos Balcãs, com a Albânia, e com os satélites da Rússia. No meio disto tudo, fica a perder a Turquia - a filha ilegítima que a família não quer reconhecer por puro preconceito.

mva | 11:30|
 

VISTO.



Bend it like Beckham. Uma variante mais leve e humorística do meu clássico pessoal My Beautiful Launderette. O tema dos indianos na Inglaterra, misturado com questões de género (e, de forma um bocado hesitante demais, orientação sexual) continua a fornecer matéria para o comentário do multiculturalismo. Ah: e pela primeira vez percebi que o futebol pode ter alguma graça. Obrigado RIta e Sara, pela sugestão!

PS: Mas o verdadeiro prazer foi ouvir de novo Hot!Hot!Hot! de Arrow, agora num versão punjabi. Quando estive na Trinidad e Tobago era a canção soka da moda.

mva | 11:18|