OS TEMPOS QUE CORREM. Miguel Vale de Almeida


18.5.04  

Sei que estás em festa, pá...

Amigos em Cambridge, Mass. (um casal hetero, por sinal), disseram que a festa foi rija. Entre outras coisas, parece que as buzinadelas não pararam. Em Lisboa, buzinadelas ouvi-as, mas eram pelo Benfica. As mesmas "buzinadelas" a que os noticiários das TVs prestaram atenção ad nauseam. Nem uma referência aos casamentos de Mass.

Esta "obsessão" com os casamentos é apenas coisa de gay? Creio sinceramente que não deve ser. Trata-se provavelmente do segundo mais importante debate na sociedade americana, depois do Iraque. Porque se trata de um debate civilizacional, quer para os apoiantes, quer para os detractores. As eleições presidenciais vão mesmo ter este como um dos temas centrais.

Sendo os EUA, quer se goste quer não, a "locomotiva do mundo", o que por lá se passa deveria ser do interesse de toda a gente, sobretudo dos media. Mas não é: o casamento de Felipe e Letizia é muito mais importante - justamente por razões civilizacionais (isto é, é uma tomada de posição claríssima no debate civilizacional sobre direitos e igualdade sexuais).

No caso português, ainda poderíamos - embora de forma provocatória - dizer que na área metropolitana de Boston (incluindo o mini-estado de Rhode Island) se encontra uma das maiores e mais históricas concentrações de luso-americanos e imigrantes portugueses. Quantos casais "LusoGay" e "LusoLes" não estarão nas filas para a licença de casamento? Cadê os repórteres "lusos"?

Provavelmente toda a atenção se desviará para as incríveis declarações dos responsáveis do PS francês e os seus argumentos tardo-católicos sobre o "egoísmo" de quem quer ter crianças. Isto é, o "egoísmo" dos gays e lésbicas, pois a procriação e a adopção hetero são "naturalmente" actos altruístas merecedores de todas as medalhas da République...

Se calhar é a idade: começo a perder a paciência e começo a entrar no que chamo o "mode sionista" - ocupa-se o Cape Cod, ou a Gran Canaria, ou Mikonos, ou um troço da Austrália e faz-se um país lgbt. Onde os heteros poderão viver em paz, sem serem "palestinizados". Mas onde os lgbts possam viver com dignidade - não só sem a perseguição dos homófobos, mas também sem o paternalismo insultuoso dos positivistas e muito pouco "iluminados" filhos da Revolução Francesa.

mva | 11:51|