OS TEMPOS QUE CORREM. Miguel Vale de Almeida


10.7.07  

Lumpen-Carmona

Entro num café perto da sede da candidatura de Carmona (a que usa o logotipos da CML sem que ninguém tenha levantado um dedo contra isso). O balcão está vazio. Ocupo um espaço e peço uma bica. Entram dois homens. Um deles coloca-se ao meu lado. O outro toca-me - sem querer e sem pedir desculpa - com uns paus de bandeiras. Rapidamente cria um espaço entre mim e o primeiro homem. Ostanesivamente, desloco-me para uns metros ao lado. Nada dizem. Observo-os: estão bêbedos. E agora este texto entra numa zona difícil: como descrever pessoas sem recorrer a estereótipos que veiculem preconceitos? Resposta: correndo o risco e fazendo-o. Os homens correspondem a um tipo social que se pode chamar lumpen. Marx descreveu-os brilhanemente em O 18 de Brumário. Correspondem aproximadamente ao que hoje se chamaria os "excluídos". Tal como no caso analisado por Marx, a eles recorrem - como exército e mão de obra - os demagogos e populistas. Nos idos do 25 de Abril, o proto-PNR general Galvão de Melo fazia isso mesmo, com o seu grupo de arruaceiros. Os lumpen - e arrisco a caricatura e, logo, o preconceito - são o tipo social de pessoa que vive em condições miseráveis mas aplaude obras como o túnel do Marquês. Aparentemente Carmona recorre ao seu exército de reserva para carregar bandeirinhas e fazer campanha. Com certeza são contratados. Com certeza há um pequeno favor dado em troca, uma promessa, uma esperança - uns arranjos na casa do bairro social, um empregozito rasca, uns trocos em troco de carregar umas bandeiras. Benesses bem abaixo de um túnel. Posso estar enganado. Eles podem até ser militantes convictos. Mas algo me diz que... (e o estereótipo e o preconceito voltam à tona, bem sei).

Fujo das bandeiras carmonistas e do cheiro a vinho às quatro da tarde. Passo pelos Smarts - vários - pintados com as cores de Carmona (outra vez: com o logotipo da CML ligeiramente - apenas ligeiramente - alterado). Qualquer coisa na cidade me perturbou o dia inteiro. Não percebi o quê. Presto agora mais atenção e finalmente percebo: lixo. Lixo por todo o lado. Lixo ao pés de cartazes com a cara beatífica de Carmona, grande líder populista populista dos velhos e excluídos e lumpens da Lisboa miserável. Grande responsável pela miséria em que nos encontramos, cidadãos sem cidade. Que haja pelo menos uma palavra de ordem para dia 15: varrer Carmona.

mva | 17:54|