OS TEMPOS QUE CORREM. Miguel Vale de Almeida


8.7.06  

Gente mal formada

«O porta-voz da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), D. Carlos Azevedo, afirmou que a "desvalorização" do conceito de família em Portugal é resultado do aumento das uniões de facto e das relações homossexuais. Em declarações à agência Lusa, D. Carlos Azevedo lamentou que a sociedade portuguesa "misture o conceito de família com outros conceitos de vida gregária", como são as uniões entre homossexuais ou as uniões de facto."Não se trata de defender um conceito tradicional", mas sim o único "modelo de família que existe", sustentou Carlos Azevedo, na véspera do V Encontro Mundial de Famílias, que hoje e amanhã decorre em Valência (Espanha), com a presença do Papa Bento XVI.» (Público)

O senhor Carlos Azevedo ("Dom"? Era o que faltava...) tem todo o direito às suas ideias e a torná-las públicas, como é óbvio. E tem todo o direito à sua religião e a praticá-la, como é também óbvio. O que o senhor Carlos Azevedo e o senhor Ratzinger não podem esperar é que milhões de cidadãos e cidadãs dos muitos países onde a sua igreja está implantada não fiquem insultados pela forma como são tratados pela ICAR. E estes cidadãos esperam que os seus estados os protejam das afirmações de pessoas mal-formadas e raivosas que explicitamente propõem impedimentos à igualdade e à liberdade, aplicáveis a quem não pertence à sua seita. Como? Não perseguindo os Carlos Azevedos e Ratzingers, é claro, mas dignificando as vidas daqueles cidadãos e cidadãs sistematicamente insultados. Como? Dando-lhes acesso aos mesmos direitos. Tão simples como isso.

PS: Concordo com Rui Tavares no Público de hoje - a esquerda portuguesa é uma porcaria na forma como trata a questão do aborto
PPS: E com Helena Matos numa parte substancial (eu concordo com a paridade): os argumentos de Alberto Martins a favor da paridade são, em suma, sexistas. A paridade não se defende com "saudades de mãe" e elogios de supostas sensibilidades femininas - uma tendência tipicamente machista. Defende-se com simples noções de promoção da igualdade entre pessoas iniquamente tratadas como pertencendo a duas categorias distintas e hierarquizadas. E a paridade, como as quotas e as discriminações positivas, são isso mesmo: reconhecer as linhas por que se cose a desigualdade, evidenciá-las na política pela igualdade e, assim, caminhar para a abolição das próprias categorias.

mva | 16:08|