OS TEMPOS QUE CORREM. Miguel Vale de Almeida


25.5.05  

A contrapelo, III.

Um dia com muitos contactos. Por razões profissionais acabo por me reunir à mesa dum café com pessoas das mais diversas áreas, minhas desconhecidas até então. Todas concordam: não podem mais com o discurso sobre o défice. Não acreditam. Porque sabem que só se diz metade, só se propõe metade. Porque sabem que há iniquidades que permanecerão, intocadas, silenciadas - nas isenções de impostos, nas benesses para altos cargos, nas absurdas empresas municipais que servem para dar empregos de gestão e fazer o que as Câmaras deveriam fazer, nas, nas, nas; porque, porque, porque.

É isso, caro José Sócrates. Sabemos que as contas estão "más". Sabemos que a administração pública é um monstro. Mas sabemos também que está mal gerida, com gente a mais nuns sítios e a menos noutros, com gente incapaz nuns sítios e competente noutros. Sabemos que acha que há fuga e evasão fiscais - nós também. Só que também sabemos que há sectores riquíssimos deste país legalmente beneficiados do ponto de vista fiscal (disso você e os seus apoiantes da oposição de direita não falam).

É por isto, José Sócrates, que muitos de nós - desde logo eu - não acreditamos e não aderiremos a uma qualquer tentativa de criar uma grande vaga de fundo patriótica. Para consensos tolos desses já nos bastou o Euro 2004. E já nos basta o aval por omissão que está a dar à criação de um "consenso" em torno dum Cavaco Silva reciclado, lavado e sebastianizado em consciência contabilística da Nação.

Não, caro José Sócrates, a mim não me convence de que isto é tudo técnico e consensual: nem a economia nem, muito menos, a política, são mera mecânica de automóveis.

mva | 18:18|