OS TEMPOS QUE CORREM. Miguel Vale de Almeida


17.2.05  

No Fórum Lisboa.

Ontem falei no comício do Bloco em Lisboa. Ao contrário de aulas, congressos e quejandos, em que me sinto à-vontade, falar em comícios põe-me em pânico. Mas parece que a coisa correu bem. Um pequeno extracto do exercício que fiz de desmontagem de ideias feitas:

«A primeira ideia feita é a de que existe algo chamado "voto útil". Esta ideia tem que ser desfeita. O único voto útil numa democracia é o voto que corresponde à consciência do eleitor. Dos eleitores espera-se que votem no partido cujo programa mais lhes agrada, cuja prestação política na legislatura anterior mais respeito lhes merece, cujos princípios, visão do mundo e propostas mais se identificam com as suas. Esse é o voto útil.

A segunda ideia feita é a de que se "roubam", "pescam" ou "se vão buscar" votos aqui ou ali, a este ou àquele partido. Esta ideia é em si mesma um insulto à democracia e à inteligência dos eleitores - já para não falar do insulto à liberdade de escolha das pessoas. Os votos não pertencem a ninguém, a não ser quando se vive em regime de caciquismo e de dependência dos favores dos poderosos - infelizmente uma realidade demasiado evidente em muitos contextos do nosso país, marcados pela associação perversa entre municípios, clubes de futebol e interesses empresariais.

A terceira ideia feita é a de que a maioria absoluta é a melhor forma de garantir estabilidade política. Também ela é falaciosa. Desde logo porque a expressão "estabilidade" não quer dizer nada, se não se explicar que estabilidade, com que meios e para que fins. Em si mesma pode querer dizer tudo e não querer dizer nada. Em democracia, os eleitores escolhem diferentes opções e é obrigação dos seus representantes eleitos procurarem, através do diálogo, da negociação e do confronto, as estabilidades necessárias para a prossecução de determinadas políticas. Que espécie de democracia é essa em que os eleitores se vêem confrontados com a chantagem de "ou nos dão o poder absoluto ou é o caos"?»

O discurso de comício permite demasiado a "desonestidade intelectual", porque é um discurso instrumental. Tentei evitá-lo, o que não é fácil.

PS: para a blogayesfera em particular (mas não só!), um extracto da parte que nos toca directamente: «O Bloco sabe que nunca este país será moderno enquanto as mulheres forem julgadas por abortarem, enquanto @s homossexuais (os gays e as lésbicas) não usufruirem dos mesmos - rigorosamente os mesmos - direitos civis que a restante população, ou enquanto dezenas de milhar de imigrantes não forem cidadãos de pleno direito, e futuros garantes da salvaguarda da nossa - e deles - segurança social.»

mva | 11:42|