OS TEMPOS QUE CORREM. Miguel Vale de Almeida


6.12.04  

Poli-pop.



Sempre tive vergonha de escrever sobre música neste blog. A razão é simples: fui um adolescente e jovem "diferente". (Não, não nesse aspecto (quer dizer, sim, nesse aspecto também, mas não é esse o point)). É que nunca prestei muita atenção à música, pelo menos não ao ponto de comprar discos, estar a par das novidades, saber quem é quem, o que fez, quando e por aí fora. Ficava claramente na margem quando os amigos falavam "dessas coisas". A ignorância musical é mais que muita, therefore the silence.

Mas o analfabetismo musical não impede uma pessoa de ser sensível à música. Hoje ia a guiar a caminho da piscina, atravessando Monsanto debaixo deste céu escandalosamente azul, e ia a ouvir os Communards, que o mais-que-tudo teve a decência de colocar no leitor de CDs. E, de repente, enchi-me de nostalgia positiva. Fiquei elated (sobre estrangeirismos, ver abaixo). Porque me lembrei, fisicamente, de como ficava elated com os Communards - triunfantes pela altura do meu coming out generalizado.

Porquê? Porque os Communards conseguiram juntar géneros e atitudes que até então (e hoje outra vez) estão separados e às vezes até se antagonizam: a estética gay e a canção de protesto. Os C. conseguiam transmitir a sensação de pertença a uma comunidade, cheia de alegria e espírito pop e provocação, e ao mesmo tempo faziam-no com uma estética (no som, na imagem gráfica, nas alusões simbólicas - até do próprio nome) que aludia a um espírito revolucionário, combativo, rebelde. Em suma, poli-pop, ou political pop, categoria que acabo de inventar...

Neste site fui encontrar um texto muito completo sobre Jimmy Somerville e o seu "programa". Às tantas o autor ou autora diz:

«Yet the UK in 1985 suddenly had the most unlikely pop star, singing Bronski Beat songs on TV. Jimmy Somerville, a short, tough-looking to the point of skinhead, gay activist sang to a fast dance beat in falsetto. Any one of these attributes was unusual enough, but he was obviously no cuddly Bee Gee and neither would he be a candidate for singing The Lion Sleeps Tonight.»

Esta descrição do Jimmy sintetiza a minha atracção: a aparente contradição, e a síntese que ela permite. Não seria altura de tornar a haver gay poli-pop?

mva | 15:38|