OS TEMPOS QUE CORREM. Miguel Vale de Almeida


28.12.04  


Autor: José Quintas

Um dia destes acordei farto de saltar entre blogs e sites, jornais e tvs, cds e dvs.

Farto de cumprir horários, de trocar lugares-comuns com colegas e amigos, de tanto tempo perdido a consumir palavras, imagens e paciência. Farto.

Saí de casa. Ao fim de alguns passos já arrastava o corpo pelas paredes ou desatava aos pontapés aos cães, aos carros e às casas.

Agredia aqui uma pessoa, mais além sacava a outra um daqueles beijos que esmagam os lábios e deixam a língua dorida quase com pena de não ter sido arrancada.

Sem palavras. Só os olhos ardiam.

Deve ter sido dessa maneira que, a certo ponto, deixei cinco ou seis pessoas a trocarem de corpos e a conhecerem-se através da pele.


Fui preso, é claro.

Estou aqui a escrever isto porque sou sobrinho do xerife.

Enfim, o tempo é já presente.


Volto para casa, olho para as paredes e saio de casa.

A vizinha do lado dispara-me um olhar assassino. Nos passeios as gentes esbarram em mim e dão-me a sentir ombros e cotovelos...

... corro até à ponte... os paralelos são frios... mas não... ainda não.

Atravesso o rio e chego a um campo.

Respiro. Deito-me nas ervas. Espreguiço-me.

Uma lebre aproxima-se. Um caracol também. Ao longe vem um grilo aos pinchos.

Mais rápida do que eles, uma vaca lambe-me, hesita e coME-ME.

mva | 18:22|