OS TEMPOS QUE CORREM. Miguel Vale de Almeida


23.11.04  

Para lá da França e dos EUA.

José Manuel Fernandes fala da oposição entre o modelo francês, onde a recusa da mistura entre política e religião se faz pela recusa da religião, e o modelo americano, onde essa recusa se faz pela aceitação de todas as religiões. Dito assim, só no plano das relações religião (institucional) - política, até parece simples. Mas na realidade o continuum religião-cultural-etnicidade é mais complicado. A oposição entre os modelos francês e americano dá-se no plano mais abrangente da oposição entre republicanismo (ou universalismo) e multiculturalismo. Se bem me lembro é este último que muito irrita JMF. Por outro lado, as simpáticas propostas de Malouf que JMF parece subscrever são, de facto, as propostas de qualquer projecto multiculturalista que não se baseie em noções essencialistas de identidade, mas sim na pluralidade cosmopolita - uma situação em que as pessoas simultaneamente acedem a uma cidadania comum, podem constituir as suas comunidades de eleição e podem ainda acabar por criar novas identidades híbridas. Quer o modelo francês, quer o americano, pecam por definições essencialistas de identidade: no primeiro caso, pelo exagero da definição essencial dos valores da "República", numa confusão nacionalista entre República Francesa e Universalidade; no caso americano, pelo exagero da definição essencial de "cultura" enquanto "comunidade" (de origem, raça, religião, etc). Não é muito produtivo continuar a discussão sobre qual dos dois escolher. Mais necessário é imaginar como transcender essa dicotomia.

mva | 11:11|