OS TEMPOS QUE CORREM. Miguel Vale de Almeida


11.10.04  

Herr Man.

Já se sabia que Herman José ia apresentar duas cantoras duma girl band que supostamente desejam casar-se. Por momentos pensou-se que talvez fosse esta a esperada oportunidade dum coming out vindo do mundo do espectáculo. E que HJ estivesse a dar algum sinal de consciência cívica - algo que não precisa, de todo, ser incompatível com o show business.

Big mistake. Logo à primeira vista se percebeu que as moças - com o seu ar de empregadas de casa de alterne - estavam a fazer um número publicitário instigado pelo seu empresário (este com o seu ar de porteiro de... casa de alterne).Estávamos, afinal, em pleno mundo reality show rasca (bem sei, é uma redundância).

Pior ainda do que a burla foi a performance de HJ. Em nome do humor desfiou toda a lista machista de observações sobre lésbicas. Ele acha - e provavelmente tem razão, do ponto de vista pecuniário - que o que vende é a chalaça rasteira.

Castelo Branco na Quinta das Celebridades com afirmações homofóbicas (mas, pelo menos, mostrando que a bichice é um traço pansexual, partilhado por Cinhas Jardins, etc); um par de alternadeiras desesperadas e exploradas fingindo que são lésbicas, para satisfação das fantasias pornográficas macho-heteras; o humorista mais mediático explorando o sexismo e a homofobia e os recantos obscuros e bafientos do armário - e pelo caminho não conseguindo, pelo menos, fazer humor. Se ainda assim aparecer um dia destes alguém com visibilidade e responsabilidade a defender o casamento para casais gay e lésbicos só pode mesmo ser por influência dos desenvolvimentos em Espanha.

PS1. Atenção ao "Prós e Contras" de logo na RTP1. Anuncia-se que uma série de "notáveis" vão falar, entre outras coisas, sobre "casamentos homossexuais".
PS2. E, já agora, atenção ao Santana Show: seremos brindados por profissões de fé democrática de igual calibre alternadeiro...
PS3. Relendo, não gostei muito do tom do que escrevi acima sobre alternadeiras. Quando fiz pesquisa no Alentejo conheci muitas alternadeiras nos bares onde ia com os meus infomantes. Não só não tenho nada contra, como não tenho que ter nada contra. A imagem que invoquei assenta na memória de um tipo muito específico de mulher que conheci - as de origem muito humilde, sobre-exploradas desde miúdas e na maior parte dos casos dependentes de drunfos e álcool. Nada que se pareça com a imagem positiva de quem gosta da profissão ou acha que vale a pena estar nela.

mva | 14:40|