OS TEMPOS QUE CORREM. Miguel Vale de Almeida


27.10.04  

Brasil II

Caxambu, MG

Acordo com a notícia da débacle José Barroso/Buttiglione. As famosas "credenciais liberais" do amigo do Papa, tão proclamadas pelo director do Público, de pouco valeram. Este caso demonstra a acepção de "liberal" usada por esta nova direita que não se diz de direita e que domina cada vez mais o espaço público português. Trata-se de uma acepção que reduz o liberalismo à economia e a uma concepção minimalista de democracia. Por isso tudo o que tenha a ver com ideologias, valores e política relacionados com a família, o género, a sexualidade, etc, é remetido para o domínio do subjectivo, da opinião, do não passível de debate político e decisão democrática. Em americano chama-se a isso "wishing away". Mas na realidade, este neo-conservadorismo que se afirma liberal é constituído por posicionamentos medrosos e tudo o que pareça novo é etiquetado - e vejam que etiquetas paradoxais - como ou demasiado americano/politicamente correcto, ou demasiado esquerdista... Em Portugal este medo tem um ambiente fértil, feito de uma obsessão pequeno-burguesa com a "moderação", que não é o mesmo que o rigor da análise ou a discussão de uma pluralidade de pontos de vista, mas simplesmente um eufemismo para "deixar as coisas como estão". Por que outra razão não se falou praticamente nada na comunicação social portuguesa da lei dos casamentos entre pessoas do mesmo sexo em Espanha, por exemplo?

Estou em Caxambu, uma estância termal nas montanhas de Minas Gerais. Aqui reunem-se, num desses hotéis românticos frente a um parque frequentado em tempos pelo imperador, os cientistas sociais brasileiros. Venho de assistir a uma discussão renhida sobre quotas para negros nas universidades públicas. Regressar ao Brasil após 4 anos de interregno assustava-me. Regressar a sítios onde vivemos normalmente resulta em dersilusão ou, pelo contrário, numa espécie de sobre-excitação. Nenhuma das duas aconteceu. Sinto outra coisa, bem melhor: normalidade absoluta. I´m home, como em Portugal.

mva | 15:25|