OS TEMPOS QUE CORREM. Miguel Vale de Almeida


3.2.04  

VISTO.

SPOILER ALERT! ESTE POST REVELA O FIM DO FILME!

Lost in translation. O filme quase que vale pela cena final. Jogando com as comédias românticas, o homem a caminho do aeroporto volta atrás, procura na rua a mulher, aborda-a e... segreda-lhe ao ouvido algo que não ouvimos. E despedem-se para sempre. Claro que faz uma enorme diferença que a mulher seja a Johansson, excelente actriz e modelo de uma beleza não estereótipa (desde logo: "gordinha"). E, apesar de Bill Murray conseguir sempre arrancar-me um bocejo, ele fica bem no papel de cansado da vida. Mas o mais interessante do filme, na maneira como o li, é que o facto de se tratar de um homem e duma mulher é um decoy: na realidade, aquela jovem inteligente vê que, décadas mais tarde na vida, pode sentir-se a mesma incapacidade de traduzir o mundo e as pessoas à nossa volta. Ele confirma isso, mas, intuimos, dá-lhe alguma esperança. Não podemos é ter acesso à receita - simplesmente porque ela não existe, ao contrário do que prometem os CDs de auto-ajuda.

Pena é que tudo isto se passe num ambiente de desagradável gozo com os japoneses - sem que a realizadora consiga convencer-nos que essa é a perspectiva das personagens e não a sua. O achado do filme está ali, na cena final do segredo. Mas o que a argumentista construiu para trás não é tão sólido quanto prometem, por exemplo, os momentos de clarividência que a personagem de Johansson demonstra.

mva | 11:18|