OS TEMPOS QUE CORREM. Miguel Vale de Almeida


29.11.03  

Posfácio

Leio o post anterior e assalta-me a dúvida autocrítica do costume: não terei caído nos mesmos erros que critico nos outros? É que escrever sobre uma experiência num país pode facilmente dar azo a toda a sorte de asneiras. A principal, de ordem metodológica, é a generalização: afinal de contas, um país não é um objecto ou unidade de análise que se meta no bolso, é sim uma imensidão, feita de diversidades. A segunda, relacionada com a autoria e a autoridade, tem a ver com as interpretações que se pode despoletar nos leitores: sendo eu (cá está a maldita profissão) antropólogo, tudo o que diga sobre um país (porque isso se confunde, fácil e erroneamente, com "cultura") pode ser tido como análise academicamente validada. Bem, quanto a isso, tirem os cavalinhos da chuva - isto é um blog/webpage, não uma revista científica. A terceira é de ordem moral: afinal de contas não obtive imensas benesses e vantagens com as minhas idas e estadias aos e nos EUA? Que raio de reconhecimento é este? E, por fim, uma questão política: como está instituída uma espécie de ressalva cultural anti-americana (partilhada por esquerda e direita, ainda que por razões diferentes, e transformada numa espécie de base identitária europeia), não corro o risco de estar simplesmente a reproduzi-la?

Contas feitas, praticamente tudo o que digo poderia ser dito por muita gente nos EUA, pois um país é um feixe de forças antagónicas, de lutas culturais e de posição. A principal armadilha a evitar no tipo de texto como o anterior é a comparação moralizadora, como quando se propõe o país (ou cultura, ou grupo, ou seja o que for) de origem como alternativa positiva.

mva | 15:18|