7.11.03
Histórias do Útero
É comum dizer-se, e com razão, que os gays usufruem do privilégio de serem homens numa sociedade patriarcal e que as lésbicas são duplamente excluídas, como mulheres. Mas às vezes as coisas têm efeitos curiosos, como quando a imagem denegridora e estereotipada do gay "efeminado" constitui a figura de exclusão máxima. Ontem, ao ver o 3º Matrix reparei nisso. Uma personagem secundária - uma moça militar de cabelo rapado, musculosa e bélica - apresenta os sinais estereotípicos da lésbica masculinizada. Mas como está a cumprir uma função "nobre" (militar, de resistente defendendo os seus), incorporando uma masculinidade que se confunde com a ideia de humanidade no seu melhor (pois...), o guionista, o realizador (e os espectadores...) não estão a gozar com ela. Apercebi-me então de como seria impossível surgir ali uma personagem de gay estereotipadamente "efeminado" que não fosse como figura de chacota. Não há outro lugar.
De qualquer modo, a moça militar morre rapidamente (o destino de pretos e homossexuais nas narrativas oliudescas). De qualquer modo, no antro dos maus (uma discoteca, gerida por um francês, claro) vê-se bem pares gays abraçados (quem mais poderia estar ali?). São gays entre o tipo clone e o tipo s/m: hipermasculinos. Ou seja: a "perversão" máxima da masculinidade, que é ela ser imitada/ironizada/performada por quem tinha "obrigação", como homem, de a ter "naturalmente".
PS: Peço desculpa pelo exercício semiótico. Faz sentido? Já agora, para quem não se lembre: Matrix quer dizer "Útero".
mva |
23:43|
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