OS TEMPOS QUE CORREM. Miguel Vale de Almeida


22.9.03  

Ó tempo, volta pra trás

O nome da activista lésbica Fabíola Cardoso foi proposto para representar Portugal na parte lgbt do próximo Fórum Social Europeu, em Paris. Como as decisões do Fórum Social Português são tomadas por consenso (um absurdo utópico, mas isso é outra história...), o nome acabou por não ser aceite porque uma pessoa vetou-o. Essa pessoa foi o dirigente de uma associação lgbt, a Opus Gay. A justificação para o veto foi que não houve busca de consenso entre as outras organizações e a Opus Gay. Mas muita da argumentação sugere que essa falta de comunicação e o nome da Fabíola confirmariam a tentativa de manipulação do movimento lgbt por parte do Bloco de Esquerda.

O que esta situação absurda e patética confirma é o caos desagradável que já se vivera no FSP: "movimentos sociais" obcecados com os partidos, vendo em todo o lado o perigo da manipulação partidária, numa obsessão mais própria do populismo demagógico anti-político do que da área da emancipação; e partidos políticos e seus satélites (sobretudo na área do PC) preocupadíssimos em como não deixar os movimentos sociais ganharem dinâmicas desafectadas das cartilhas ideológicas. Ao contrário de algum wishful thinking o FSP não deu nada de muito novo à política portuguesa com p grande nem promete nada de especial (eu não sei o que é a alter-globalização proposta porque nunca ninguém me disse se ela está do lado da regulação ou da revolução, ou de qualquer outra coisa acabada em ão). Os movimentos sociais são uma joke e os partidos da esquerda são tristes grupos enquistados (como o PC) ou nebulosas titubeantes, como o PS.

Claro que sou suspeito na minha opinião: acho que, neste panorama, o BE ainda promete qualquer coisa de interessante, e acho que o movimento social lgbt deu um salto qualitativo no FSP. É sintomático, pois, que seja o BE o papão para certos sectores, assim como é sintomático que seja o movimento lgbt o mais atingido por estratégias divisionistas e paranóicas.

Acabem com o BE e com o movimento lgbt e poderemos todos regressar, descansados, ao remanso do país podre e patriarcal, onde então nos poderemos dedicar à queixa constante.

Bem haja, Opus Dei, perdão, Opus Gay.

mva | 16:53|