OS TEMPOS QUE CORREM. Miguel Vale de Almeida


6.8.03  

Novos mitos precisam-se
Pode-se dizer que os mitos são histórias que condensam os elementos centrais de uma determinada visão do mundo e forma de organização da sociedade. Atribuídos a antepassados, divindades ou ao primórdio dos tempos, a sua autoridade radica na sua cristalização, servindo para controlar a mudança social. Ao contrário do que se pensa, não são só os povos ditos primitivos que se orientam pelos seus mitos. No mundo ocidental, temos o mito judaico-cristão, exactamente da mesma natureza e servindo exactamente para o mesmo. A propósito do senhor Ratzinger mencionar constantemente o mito fundador para justificar a exclusão de pessoas, lembrei-me de como no filme "Hedwig and the Angry Inch", a canção "The Origin of Love", de Stephen Trask, propõe um novo mito, mais adequado à variedade sexual humana (e ele nem é tão novo assim, pois ecoa algumas versões da antiguidade grega). Segundo ele, em tempos imemoriais havia três espécies de "gente", todas elas compostas de siameses: pares de homem e mulher, pares de mulheres e pares de homens. Não sabiam o que era o amor. Por causa de uma asneira qualquer (é sempre assim nos mitos), os deuses puniram-nos e dividiram os siameses em pessoas individuais. Nasceu então o amor - um side effect da ira divina... - fruto da vontade de re-união das metades separadas. Como é óbvio (para mim, pelo menos, é-o) o amor surgiu nas três possibilidades combinatórias: amor entre mulheres, amor entre homens e amor entre homens e mulheres. Se se pudesse decretar mitos, propunha já a inclusão deste na Bíblia e na Constituição...

mva | 22:20|