OS TEMPOS QUE CORREM. Miguel Vale de Almeida


17.6.03  


M****
Esta é a Lisboa que deveria ser mostrada aos turistas, em vez das pitorescas imagens do rio. Porquê? Porque esta é que é a Lisboa real, da maioria dos seus habitantes. Mais: isto não se passa num qualquer subúrbio de terceiro mundo ou num "bairro social" (onde, de qualquer modo, não deveria passar-se...). Passa-se dentro dos limites da cidade, numa zona de classe média. Lisboa é isto: zonas "expectantes", sem ajardinamento, com lixo, ladeadas de passeios para estacionamento de carros. Aquele poste de candeeiro no meio, já agora, não dá luz. Entretanto, Santana Lopes decidiu alcatroar a rua toda, que nem precisava. Para quê? Para satisfazer os automobilistas, pois toda a gente sabe que a maior parte das pessoas está-se nas tintas para o arranjo urbano, preocupando-se mais com os carros, a "mobilidade" e uma vontade doida de chegar depressa aos sítios - num país onde, de qualquer modo, as pessoas chegam atrasadas por desrespeito e desleixo e não por causa do trânsito. É caso para dizer que Santana Lopes e a maior parte dos lisboetas estão feitos um para os outros. Armado em cidadão electrónico, mandei um mail para a CML. A resposta, surreal, dizia que não havia nenhum problema, que tudo estava tratado - um pouco como se o funcionário nem sequer tivesse percebido a que problema eu me referia. Nós, antropólogos, chamamos a isto relativismo cognitivo. Em linguagem plebeia: quem está habituado à m****, não vê a m****.

mva | 19:37|