OS TEMPOS QUE CORREM. Miguel Vale de Almeida


26.5.06  

A política sexual do governo

Um bocadinhozinho de melhoria nas leis de acesso à nacionalidade pelos imigrantes. Um bocadinhozinho de legislação sobre reprodução medicamente assistida, considerando que não havia nenhuma legislação. Um bocadinhozinho de "talvez, mas não agora" sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Um bocadinhozinho de "entusiasmo" sobre a despenalização do aborto, num referendo a acontecer este ano (talvez). Bocadinhozinhos. Imediatamente "compensados" por incentivos à maternidade; definições inconstitucionais dum tipo de família modelo; exclusão inconstitucional de mulheres sós, lésbicas e gays; insistência no referendo do aborto em vez de legislação no parlamento; punições na segurança social para quem não reproduza; lançamento de um clima demagógico de medo em relação à quebra demográfica, como se houvesse alguma mais valia em ter crianças portuguesas-mesmo, como dizia o outro que está em Belém. Não admira que uma histeria maternal-nacional tenha surgido em torno do fecho de algumas maternidades ou do "horror" por haver crianças a nascer em Badajoz. Como pode, pois, admirar que a JSD surja com uma campanha a favor da rápida e patriótica inseminação das raparigas? A oposição limita-se a exigir apenas um pouco mais do que aquilo que o governo "socialista" propõe. Fá-lo a JSD, como o fazem os promotores dum referendo contra a reprodução medicamente assistida, por supostamente ser demasiado liberal.

Desengane-se quem aceita a teoria de que os partidos do centro são hoje iguais na política económica e tentam diferenciar-se pelos "valores civilizacionais". Pelo menos em Portugal não parece aplicar-se. O governo assume tudo para si: liberal(érrimo) na economia, anti-liberal nos costumes (espera: mas não é essa a definição dum governo conservador?) Partindo do princípio que se consideram socialistas ou social-democratas, que imagem do país têm para governarem desta maneira? Quem lhes anda a dar "informação" sobre os valores dos portugueses? Quem a interpreta? Como a interpreta o governo? E mesmo que a informação e a interpretação batam certo, porque acham que devem governar no passado? Em suma: de que é que têm medo?

Ou será (oh, assustadora hipótese!) que estão apenas a defender aquilo em que acreditam?

mva | 03:22|